Já faz alguns anos que tive meu primeiro contato com a escrita da misteriosa Elena Ferrante. Comecei com Dias de Abandono e, no ano passado, li A filha perdida, tendo este último me agradado muito. Daí comprei o box da tetralogia napolitana, que eu acredito ser o trabalho mais famoso da autora. Fiquei esperando um momento oportuno para começar, e aí veio a leitura conjunta organizada pela Mell Ferraz do Literature-se: a oportunidade perfeita! Li tão rápido que nem respeitei o cronograma, já emendando no segundo livro da tetralogia. Hoje venho então compartilhar as minhas impressões sobre A amiga genial.
Uma narradora não muito confiável
Infância e Adolescência
A amizade delas é o verdadeiro motor do livro. Longe de ser idealizada, é uma relação intensa e complexa, feita de admiração e inveja, apoio e competição. É impressionante como a autora consegue fazer a gente torcer pelas duas ao mesmo tempo e, ainda assim, entender perfeitamente os ciúmes que uma sente da outra. Você é puxado para dentro daquele universo napolitano dos anos 1950/60 e fica na torcida para que ambas consigam encontrar seu caminho, cada uma à sua maneira.
Nápoles como personagem
Desde as primeiras páginas, fica claro que o bairro napolitano onde Lenu e Lila crescem é muito mais que um cenário: é quase uma entidade viva. A narradora se refere a ele com uma familiaridade que beira a intimidade, como se descrevesse um personagem complexo e opressor. Suas ruas, famílias e códigos de conduta formam um organismo que dita o ritmo de vida de todos, observando, premiando e punindo. Para as protagonistas, o bairro é inicialmente o único universo que conhecem. A beleza da narrativa está justamente em acompanhar como essa percepção se expande: aos poucos, a escola e os livros se tornam janelas para outros mundos possíveis. O crescimento delas é medido pela tensão constante entre a raiz que as prende ao bairro e o desejo de explorar o que existe além dos seus limites.
A boa trama italiana
A narrativa de Elena Ferrante em A Amiga Genial possui um vigor inegável, evocando as grandes histórias de famílias italianas, repletas de drama e paixão. Contudo, essa "trama italiana" vai além das explosões emocionais, das gritarias e das brigas que ecoam pelas praças. Ela se constrói na intrincada rede de relações humanas, onde os laços familiares e comunitários são ao mesmo tempo fonte de apoio e de conflito incessante. A honra, a vingança e o orgulho permeiam as interações, ditando comportamentos e gerando tensões que explodem ou fervem sob a superfície.
É uma trama onde os segredos de cada casa não ficam confinados, vazando pelas janelas e alimentando a fofoca e o julgamento social, criando um ambiente de vigilância constante. Ferrante, com maestria, pinta um retrato cru da luta por ascensão social em um bairro pobre de Nápoles no pós-guerra, onde cada escolha das personagens é ponderada pelo peso da tradição e a ânsia por um futuro diferente. Essa combinação de realismo social, com suas pressões econômicas e culturais, e a intensidade dos vínculos humanos, sejam de amor, ódio, admiração ou inveja, é o que torna a leitura tão viciante, te fazendo querer avançar mais a cada capítulo.
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A complexa e multifacetada amizade entre Lila e Lenu, tecida de admiração e rivalidade, é o coração de um universo onde Nápoles se ergue como um personagem vivo, moldando destinos e oferecendo um pano de fundo para essa trama. É uma leitura que agarra o leitor desde as primeiras páginas, convidando-o a mergulhar profundamente naquele mundo. Vivenciar a história de Lila e Lenu é uma experiência literária viciante e inesquecível, que certamente fará você perder a noção do tempo e sentir-se parte daquele bairro, deixando uma marca duradoura muito além da última página. Recomendo demais essa leitura.
ISBN: 978-8525060600
Editora: Biblioteca Azul
Nota: 4,5/5,0 ⭐
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